Mais de 700 processos judiciais da época da ditadura militar brasileira (1964-1985), muitos dos quais contêm depoimentos, assim como detalhes de prisões, torturas e humilhações sofridas pelos presos, estarão disponíveis para leitura na internet. O comunicado foi feito pelo Ministério Público Federal no dia 14 de junho, em cerimônia de repatriação dos documentos, que estavam guardados nos Estados Unidos e foram entregues às autoridades pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI), organização ecumênica internacional sediada na Suíça, e pelo Center for Research Libraries, instituição acadêmica norte-americana que preserva arquivos de diversas partes do mundo.
O acervo faz parte do projeto “Brasil nunca mais” e serviu de base para livro de título homônimo, publicado em 1985 durante o processo de democratização do país. O material foi reunido de forma clandestina, ainda durante o governo militar, para conseguir evidências de violações a direitos humanos praticadas por agentes do Estado.
De acordo com informações do jornal O Estado de S. Paulo, a iniciativa foi da advogada Eny Raimundo Moreira, que fotocopiou processos do Superior Tribunal Militar entre os anos 1964 e 1979 – os defensores pediam vistas dos autos e, àquela época, a lei permitia que eles estudassem os processos durante 24 horas. Muitos advogados tiveram apoio logístico e financeiro de dom Paulo Evaristo Arns, então cardeal de São Paulo, e do reverendo presbiteriano Jaime Wright, que ajudavam a microfilmar os documentos e os enviavam aos Estados Unidos.
Os processos, datados de 1961 a 1976, somam cerca de um milhão de cópias em papel e mais de 540 rolos de microfilme. Entre eles há depoimentos de ex-presos políticos e a identificação de agentes que praticavam tortura. Os dados serão digitalizados e deverão ser usados pela futura Comissão da Verdade para investigar os crimes praticados naquele período.
Tramitava no Senado, em regime de urgência, projeto de lei (PL 41/2010), já aprovado pela Câmara dos Deputados, que permitiria o acesso da população e de historiadores a documentos do Estado classificados como ultrassecretos e reduziria o prazo de sigilo dos papeis (de 30) para 25 anos, limitando também a possibilidade de renovação do prazo máximo de sigilo a uma única vez. Dessa forma, o material perderia a condição de segredo de Estado em 50 anos.
No entanto, supostamente por pressão de ex-presidentes da República (José Sarney, atual presidente do Senado, e Fernando Collor), o governo, que era notoriamente favorável à abertura dos documentos, recuou e passou a defender a manutenção do sigilo eterno. A atual presidente declarou no dia 17 de junho que seu posicionamento foi modificado em função de ponderações feitas pelos Ministérios da Defesa e das Relações Exteriores, no sentido de que a lei abriria brechas para três tipos de documentos (ultrassecretos, secretos e reservados), cujo acesso irrestrito poderia representar ameaça à soberania e integridade do território nacional, além de colocar em risco a defesa e as relações internacionais do país.
Em relação a informações sobre violações de direitos humanos, a presidente rechaçou a possibilidade de mantê-los em segredo. “Para alguém não abrir [os documentos] depois dos 25 anos, há de ter uma justificativa e um fundamento. Agora, no que se refere a direitos humanos, não existe nenhum caso que possa ser ultrassecreto”, afirmou.
Com a retirada do regime de urgência, a proposta ficará sob a responsabilidade de Fernando Collor, presidente da Comissão de Relações Exteriores, sem que haja pressão de tempo para votação. O senador Romero Jucá, líder do governo na casa, calcula que levará “de dois a três meses” para ajustar o texto, de modo que o projeto só será votado no Senado a partir de agosto e, como terá de retornar para Câmara, é possível que a proposta seja definida apenas em 2012.
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, disse que recorrerá ao STF (Supremo Tribunal Federal) caso o Senado mantenha o sigilo eterno sobre os documentos oficiais. Para ele, não há motivos para que papéis históricos permaneçam em segredo e qualquer barreira ao direito à informação pública é inconstitucional. “O direito à verdade é um direito fundamental. Qualquer iniciativa que busque afastá-lo tem déficit de constitucionalidade”, afirmou.
O ex-ministro (de Direitos Humanos) Paulo Vannuchi declarou que “não tem o menor sentido manter em sigilo documentos da Guerra do Paraguai ou do tempo do Barão do Rio Branco” e ressaltou que “é marca do passado ditatorial de pessoas que não conseguiram fazer a transição para a democracia”.
Fonte: IBCCRIM
Sobre a Ditadura Militar, a Editora Revista dos Tribunais publicou a obra: Crimes da Ditadura Militar
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